Nas capitais, autoridades reforçam medidas de segurança temendo ataques de "jihadistas europeus". Governos estudam endurecer leis que impeçam islamistas do continente de viajar à Síria e ao Iraque.
O diretor do Departamento Federal de Proteção da Constituição da Alemanha, Hans-Georg Maassen, foi recentemente bastante claro quando alertou que os jihadistas alemães que retornam ao país são uma ameaça à segurança doméstica. Ele afirmou que a adesão à organização terrorista "Estado Islâmico" (EI) ainda cresce, e que mais de 450 pessoas já deixaram o país com destino à Síria e ao Iraque.
Massen falou de jovens "absolutamente brutais" e que estariam "seguramente em posição de realizar crimes graves na Alemanha". Estaria o país na condição de se tornar um dos alvos do EI, em razão de sua participação na campanha contra a organização islamista?
Segundo pesquisa conduzida pela rede de televisão N24 e pelo instituto de pesquisas Emnid, 58% dos alemães temem que o risco de um ataque terrorista tenha aumentado desde que o governo alemão enviou armamentos às milícias de curdos peshmerga, que combatem o EI no norte do Iraque.
Em resposta ao aumento da ameaça – ou ao menos à percepção do aumento da ameaça – o governo alemão visa endurecer suas leis. A parlamentar Eva Högl, do Partido Social-Democrata (SPD), que divide o poder com a União Democrata Cristã (CDU) da chanceler Angela Merkel, afirmou que a coalizão havia "concordado em uma série de etapas no intuito de lidar melhor com a ameaça islamista".
Berlim verifica se é possível remover a dupla cidadania dos islamistas alemães, o que, legalmente, é um assunto delicado. Já há algum tempo o debate gira em torno do cancelamento da carteira de identidade dos jihadistas, o que evitaria que viajassem para o Oriente Médio através da Turquia.
O Partido Verde já pediu ao governo que adote essa medida o mais rápido possível. "Já deveria ter acontecido há muito tempo, e teria sido muito mais eficiente do que esse debate sem fim sobre a expatriação dos jihadistas que voltam ao país", declarou o parlamentar verde Volker Beck.
Estado de direito precisa ser "afiado"
O parlamentar da CDU, Thomas Strobl, acredita que a adesão à organizações terroristas deve ser, de modo geral, sujeita a punições. Além disso, segundo ele, as obstruções impostas aos promotores deveriam diminuir quando se trata daqueles que são treinados por essas organizações.
Strobl afirma que a Alemanha precisa revisar seu código penal, em particular, as diretrizes para os procedimentos dos processos criminais relacionados aos islamistas. Ele ressalta que o Estado de direito precisa ser "afiado".
Em entrevista ao portal de notícias Spiegel Online, o ministro da Justiça, Heiko Maas, concordou que esta deve ser uma prioridade, com a ressalva de que os padrões do Estado de direito devem continuar altos. Mesmo porque, diz ele, o objetivo dos islamistas é justamente restringir a liberdade e o Estado de direito.
Segundo as práticas atuais, no entanto, é difícil impôr proibições de viagem aos simpatizantes do EI, explica o diretor do serviço de inteligência doméstica do estado alemão da Renânia do Norte-Vestfália, Bukhard Freier.
"Temos que provar no tribunal que a pessoa viaja à Síria com a intenção de lutar", explica Freier em entrevista à DW. "Isso não é sempre possível. Nesses casos, os jovens estão aptos a viajar e não podemos fazer nada para impedi-los."
As autoridades de segurança da Renânia do Norte-Vestfália estão sob pressão, uma vez que uma grande parte dos jihadistas alemães vem do estado. Freier, no entanto, não acredita que a violência salafista seja um problema essencialmente alemão.
"A ida e o retorno de jihadistas é um problema europeu. Por exemplo, muitos outros partiram da França, Holanda e Bélgica para se juntar à luta", explica.
Estratégias nacionais para um problema europeu
A opinião de Freier é apoiada pelo coordenador de políticas antiterroristas da União Europeia (UE), Gilles de Kerchove. Em entrevista à BBC, ele afirmou que, além da Alemanha, a maioria dos jihadistas europeus vêm da França, Reino Unido, Suécia e Dinamarca, e em menor número, da Espanha, Itália, Irlanda e Áustria.
Kerchove estima que em torno de 3 mil cidadãos europeus viajaram para aderir à luta na Síria e no Iraque, e que cerca de 120 retornaram. Destes 120, aproximadamente 25 se envolveram em combates ou receberam treinamento terrorista. Ele disse também que os recentes ataques aéreos realizados pelos Estados Unidos e seus aliados aumentaram a ameaça de atentados terroristas na Europa.
Em toda a Europa, esforços estão sendo feitos, através de prisões e acusações, para demonstrar que a situação está sob controle. No Reino Unido a polícia prendeu recentemente dois homens em uma operação antiterrorista, acusados de "incitação ao terrorismo".
O governo da Espanha anunciou a prisão de nove supostos jihadistas, suspeitos de estarem ligados ao EI. O grupo teria agido no enclave espanhol de Melilla, no norte da África, e na cidade próxima de Nador, no Marrocos.
Estima-se que entre 1.500 e 2000 jihadistas marroquinos estejam participando dos combates na Síria e no Iraque, em associação ao EI e outros grupos. Assim como os europeus, o governo marroquino também teme que após retornarem ao país, os islamistas possam realizar atentados terroristas.
De acordo com o jornal belga L'Echo, autoridades da Bélgica calculam que até 400 belgas tenham viajado à Síria para aderir aos combates. Estima-se que cerca de 90 deles já tenham retornado. Um franco-argelino é acusado de realizar um ataque ao Museu Judaico de Bruxelas em maio deste ano, que causou quatro mortes.
"Trabalhamos 24 horas com o problema dos combatentes que retornaram" declarou um representante das autoridades judiciárias. Segundo relatos na imprensa, as autoridades belgas já conseguiram evitar diversos ataques planejados por jihadistas, incluindo um atentado ao edifício da Comissão Europeia.
Precauções de segurança e leis mais rígidas
A França se coloca como um dos principais alvos dos islamistas, sentimento que ganhou ainda mais força após a recente decapitação de um turista francês por jihadistas na Argélia. Até o momento, a França e o Reino Unido são os únicos países que se juntaram aos ataques aéreos realizados pelos EUA no Iraque.
De fato, a França tem mais cidadãos militantes do EI do que qualquer país europeu. O ministro do Interior francês estimou recentemente que 930 deixaram o país para se juntar aos combatentes na Síria, dos quais cerca de 180 retornaram.
Nos círculos da segurança nacional francesa, o risco de um ataque promovido por apoiadores do EI é levado bem a sério. O programa de contraterrorismo do país, o Vigipirate, aumentou as patrulhas de segurança nas atrações turísticas, aeroportos e estações ferroviárias.
No Reino Unido, o primeiro-ministro David Cameron considerou os simpatizantes do EI uma ameaça à segurança nacional. Já existem planos de introduzir leis antiterror mais rígidas para deter o fluxo de cidadãos britânicos que aderem ao EI.
Todos os países membros da UE deverão agora fazer o que for necessário para deter os "jihadistas viajantes". Na semana passada, o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou por unanimidade que todos os Estados membros da ONU deverão reforçar os controles de fronteira e as inspeções. As medidas são uma tentativa de identificar e prevenir novos recrutamentos, transporte e esforços de organização por parte dos terroristas do EI.
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